A arquitectura é uma das disciplinas mais relevantes na história da humanidade, com a sua função primordial de criar abrigos para proteger o ser humano, as actividades desencadeadas por este e alojar as suas memórias. A par do urbanismo que agrega as diversas singularidades arquitectónicas independentemente das escalas, a arquitectura constrói cidade, preserva património oferece identidade e sentido de pertença aos habitantes da sua urbe.
A memória colectiva, associa-se aos
espaços de forte identidade, que ocupam os espaços centrais da cidade, onde o
frenesim diário da mobilidade, a par da vida económica, também contribui para a
afirmação da monumentalidade dos centros históricos.
O Mercado 2 de Maio, insere-se em todos estes aspectos, com uma implantação favorável no tecido urbano denso da cidade histórico. Fronteiro ao eixo, pedonal de ligação entre o centro administrativo (Rossio), transição e enquadramento e transição visual entre a cidade e os arredores - a rua Formosa. Bem com um eixo de ruptura rectilíneo de confortável transposição da orografia que contrasta com os restantes arruamentos de origem medieval - a rua do Comércio.
O mercado foi uma peça arquitectónica
de relevo na expansão na cidade no século XIX, de um ambicioso e contundente
plano de obras municipais com vista à monumentalização e introdução de novos
estilos arquitectónicos.
O estilo arquitectónico é a soma de
uma geometria e volumetrias rectas, com frente de rua com grandes vãos
clássicos e outra despojada com um portal em evidência. Estes atributos são convites
aos simples transeuntes a uma visita a um recinto de respiração, único no
núcleo urbano muito denso da cidade. O conjunto com duas alas de comércio e
recinto com duas plataformas sem obstáculos formam perfis puros, sem ofuscar a
frente de rua sul da rua Formosa (visto do interior do recinto). Persistem mais
dois torreões “extras” que assinalam a quebra das plataformas.
A volumetria não é impositiva, é
sublime perante o edificado fronteiriço, conjugado com o uso de cantaria em granito,
telha de cerâmica e as tonalidades suaves da cor das fachadas, marcam a imagem
da cidade. A imposição é assim funcional e de memória primordial o inesquecível
comércio de bens alimentares. A tímida
imposição deste é sublinhada pelos “torreões” de somente 2 pisos com coberturas
de 4 águas (quase que “pináculos”) nos extremos da parcela adaptados à escala
de um todo conciso. Todo o resto convive em harmonia e nobreza com o
protagonismo tímido pelos “torreões” bem como o portal isolado.
Foi alvo de pelo menos uma
intervenção, com a introdução de mais volume edificado que se transformou num
recinto gerável no seu tempo de abertura ao público, mas que depois da
intervenção de Siza Vieira restou um portal que isolado transmite nobreza ao
espaço.
O mercado ou praça simboliza os 3 princípios Vitruvianos da arquitectura VENUSTAS a beleza com regras, forma e adequabilidade dos materiais, FIRMITAS com soluções construtivas duráveis e de grande estabilidade temporal que continuará a persistir.
O último princípio UTILITAS, assente
no programa, com funcionalidade que proporciona comodidade na usufruto e
habitabilidade (estadia).
A discussão sobre este espaço
centra-se nestes últimos 5 anos com a insatisfação e tristeza de uma larga
maioria de viseenses, em contraste com um processo opaco de procura desenfreada
no sentido tornar novamente o mercado no centro de vida na cidade.
Siza teve como princípio projectual,
“a constituição de um centro cívico, estrutura de lazer comércio e cultura,
num espaço precioso, aberto bem proporcionado e com uma geometria perfeita onde
os interiores apenas seriam retocados”.
Esta longa descrição da Praça 2 de
Maio, vem ao encontro de afirmar enquanto grupo de reflexão o nosso total
repúdio, pela intervenção errática, em plena zona de protecção da zona
histórica e da Sé Catedral (instituída em 1963).
Não respeita as pré-existências atrás
referidas, ofusca a exemplaridade do edificado envolvente, a forma da cobertura
fotovoltaica é dissonante com as frentes da rua Formosa e do Comércio. As
coberturas são desproporcionais em escala, em relação ao todo construído à
composição geométrica das fachadas e traça original. A materialidade da
estrutura em aço é totalmente dissonante com o granito, o barro das telhas, o
reboco e tonalidade das fachadas. Por outro lado, o excessivo pé direito não
garante protecção à chuva e ventos fortes, bem como a tonalidade dos painéis de
vidro fotovoltaicos, irão gerar mau comportamento ambiental térmico e sonoro
gerado pelo efeito de barreira e prejudicará as espécies arbóreas presentes.
Toda a estrutura de suporte em aço típica de grandes áreas livres, está
associada a pavilhões industriais quando a intervenção se relaciona com um
conjunto arquitectónico sóbrio e singular na cidade. Simplesmente, um puro acto
de vandalismo mesquinho e prepotente.
A história e o tempo o dirão!
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